O Metro

As pessoas que andam de transportes públicos em Lisboa são heróis. Vou falar do Metro mas decerto que tal se aplica também a outros transportes.

De manhã, para quem vem de comboio de uma margem ou outra e chega Lisboa na estação de Sete Rios depara-se com um mar de gente que tenta descer as escadas rolantes, ou outras menos rolantes, por forma a rapidamente chegar à plataforma de embarque. Atropelam-se, pisam-nos os calcanhares, roçam, empurram, chamam nomes feios (sim! feios) a pessoas que não conhecem de lado nenhum... as vezes de boca semicerrada para ninguém ouvir... afinal somos educados. Ou não?

Depois quando se chega a plataforma de embarque do Metro, deixam de haver regras. Sim, só nessa altura.


As pessoas perdem tempo a fumar o alcatrão ou a beber as borras do café até que se lembram que falta 10m para entrar e a partir daí vale tudo. Chega-se a ver a malta a olhar sorrateiramente pelo canto do olho, de volta, a criar estratégias para entrarem no metro. Começa-se logo de manhã a exercitar a massa cinzenta.

Quando chega o dito, começa a parte gira da questão. É obvio que tem de haver uma vertente lúdica no meio disto tudo, caso contrário dava tudo em doido. O contacto Humano. O calor Humano. Entre outras coisas menos humanas. As pessoas já sabem onde o Metro pára, por isso fazem logo o ajuntamento estratégico. Para quem não sabe isto é um termo técnico. Só quem lá anda é que o conhece, não vale a pena tentar explicar.

Quando se abrem as portas entram logo de rompante empurrando tudo quando lhes aparece a frente. Normalmente, e porque o homem é um ser que se adapta bem a condições adversas, as pessoas que querem sair antecipam-se e empurram as pessoas que estão á sua frente e essas por suas vez tentam empurrar também para não perderem o lugar. Bonito de se ver.

No meio de tanto empurrão há a grávida que leva uma pisadela ou um encontrão, há o senhor ou a senhora de mais idade que com dificuldade lá consegue entrar, não havendo para isso que haver qualquer acto cívico por parte de quem ali estava mesmo ao lado, e por aí fora. É brilhante sem dúvida. É nestas alturas que nos lembramos com mais orgulho de que estamos, obviamente, num país civilizado

Já dentro do Metro, finalmente, respira-se de alivio por uns segundos por se ter conseguido apanhar o tal que nos deixa precisamente a 5m antes de entrar ao pé da empresa. Mas não respiramos fundo senão teremos de levar com o cheiro a sovaco de quem teve de ir a correr para apanhar a camioneta ao pé de casa.... com o Gás Metano de quem acha que por estar no meio de tanta gente pode libertar silenciosamente o aroma natural.... e pensa que ninguém sabe de onde vem... já para não falar de quem obviamente depois de fumar lá fora vem para o Metro partilhar com os demais cidadãos o cheiro que fica entranhado no seu bafo e na sua roupa.

Ainda nesta sala de espera, as pessoas agarram-se onde podem e outras não se agarram sequer. Estas ultimas, acham que é bonito apoiarem-se nas pessoas que se tentam segurar. Pisadelas, cotoveladas, e até um ocasional e inocente roçar de diversos membros pelas outras pessoas são uma tradição. Se bem que alguns terão muita sorte se conseguirem mexer os olhos. Esses são os que chegam ao trabalho com mau humor, por não terem conseguido participar nas festividades de uma forma mais activa.

Ha quem chegue de mau humor ao trabalho também porque o Metro as vezes teima em não andar. Mas isso são aquelas pessoas que não são heróis... são apenas chatos que acham que estar preso dentro de uma caixa de metal dentro de um buraco com ar pestilento agarrado e encostadinho a tanta gente é algo despresível. São pouco sociais, coitados.

As pessoas quando chegam ao trabalho mal podem esperar voltar para casa para poderem usufruir novamente desta alegria que é andar nos transportes públicos em Lisboa. De tal forma que é ver o povo todo a correr para apanhar o tal Metro que já vai atulhado... mas onde entra mais um. Pelo menos mais um. Nem que a senhora que já está bem encostada e apertada tenha de ser um pouco empurrada. Afinal onde cabe o dobro da lotação máxima, cabe o dobro + 1. Pelo menos assim dita o senso comum.

Eu nem sei como é que há gente que prefere gastar rios de dinheiro e trazer o carro para a cidade.


1 comentário:

Marcel Kappes disse...

O mesmo se dá, inacreditavelmente, em quase todo mundo... aqui no Brasil, é exatamente a mesma coisa, tirando, talvez, o metano, que aqui é trocado por litros de perfumes baratos jogados apressadamente e exageradamente em pelo menos 25% dos pescoços e punhos... pobre dos outros 75%...

Muito bom o post!